Pela pergunta
que Moisés faz a Deus, na primeira leitura de hoje, pelo que Deus responde e
pelo que Cristo diz de si mesmo no Evangelho, não tenho dúvida de que a
Eucaristia, de hoje, nos permite escolher D
E U S como tema para nossa reflexão.
1. DEUS, OBJETO DESCARTÁVEL
1. DEUS, OBJETO DESCARTÁVEL
No mundo, sociedade e
cultura secularizada, de hoje, com forte tendência secularista, constatamos um
esforço de tornar Deus um objeto dispensável ou, ao menos, descartável. Em
algumas pessoas, setores ou grupos, como declarada negação, em outros, dúvida e
interrogação, ainda em outros, inconfessada, mas inegável ignorância e nos
últimos negação do Deus apresentado pelas religiões tradicionais e busca de
outras definições.
2. DEUS, O ETERNO NAMORADO
Mas, como sabemos que,
não só no ser humano, mas em todas as criaturas, a SEDE DE DEUS é um fenômeno antológico,
a pergunta QUEM É DEUS?, transformou-se num fenômeno antológico, que perpassa
todas as culturas e todas as gerações.
Assim o pedido de Moisés "Mostra-me tua
glória!"(Ex.33,18) que, em outras palavras, queria dizer: Quem és?! Dá-me
tua identidade, que ajude a conhecer teu direito e poder torna-se
um pedido representativo de toda a criação respondendo a pergunta: "Que
direito tens de dizer, ou ensinar, obrigar e exigir alguma coisa?!
Para Moisés, além
deste anseio universal esta resposta era como que um cartão de identidade,
ou carta de recomendação, para apresentar tanto a seu povo, como ao Faraó,
provando sua autoridade e direito de ser respeitado e obedecido.
3. DEUS NÃO EXISTE!
Respondendo a Moisés,
Deus quis reafirmar, através de gesto e linguagem simbólica que ele é "O
OUTRO", O INDESCRITÍVEL, O IRRECONHECÍVEL, a não ser através de sinais e
comparações, que nunca atingem a essência de seu ser. Em outras palavras:
ninguém, neste estágio de vida física, histórica, temporal, conseguirá entender
a Deus. Isto só será possível no estágio posterior à ressurreição.
"Javé
respondeu: farei passar diante de você todo o meu esplendor e pronunciarei,
diante de você o meu nome: JAVÉ.
Terei piedade, de quem eu quiser ter piedade e terei compaixão de quem eu quiser
ter compaixão. E acrescentou: você não poderá ver o meu rosto, por que ninguém
poderá ver o meu rosto e continuar com vida. E Javé disse ainda: Eis aqui um
lugar junto a mim. Fique em cima da rocha.
Quando a minha glória passar, eu colocarei você na fenda da rocha e o cobrirei com a palma da mão, até que eu tenha passado. Depois tirarei a palma da mão e me verás pelas costas. Minha face, porém você não poderá ver" (Ex.33,19-23). O próprio Jesus o disse: "Ninguém jamais viu a Deus" (Jo. 1,18)
Quando a minha glória passar, eu colocarei você na fenda da rocha e o cobrirei com a palma da mão, até que eu tenha passado. Depois tirarei a palma da mão e me verás pelas costas. Minha face, porém você não poderá ver" (Ex.33,19-23). O próprio Jesus o disse: "Ninguém jamais viu a Deus" (Jo. 1,18)
E é fácil
de entender. Todo e todos os nossos conhecimentos são midiatizados pelos
sentidos, como ensina a filosofia: "Nada chega à inteligência, a não ser
que passe, antes, pelos sentidos."
Ora, as realidades pós-morte não são
realidades físicas, materiais, ou sujeitas ao tempo histórico e, portanto, não
são captáveis pelos sentidos. Assim sendo, nossa inteligência não tem o que
a filosofia chama de "Princípio de Identidade", que a
possibilite captar as realidades ultra-terrenas.
Foi isto que levou um teólogo católico do século XII, Eckart, a afirmar,
para escândalo da Igreja, que ''DEUS NÃO EXISTE", querendo, com esta
expressão escandalosa dizer que o que falamos sobre Deus não é realmente o que
Deus é, mas uma imagem falsa, humana, materializada, ou mentalizada dele.
Este Deus, de fato, não existe.
São
Paulo disse a mesma coisa, quando afirmou "Agora vemos como que através de
um espelho, de maneira confusa, mas, depois, veremos como as coisas realmente
são. Agora meu conhecimento é limitado, mas, depois, conhecerei como sou
conhecido" (1Cor. 13,12)
É o que quer fazer entender, também, uma lenda atribuída a Santo
Agostinho, que um dia, andando na praia, meditava, tentando entender quem é
Deus. De repente apareceu um menino, que furou um buraquinho na areia da praia,
depois pegou uma conchinha, ia até a água do mar, enchia a conchinha e a
despejava no buraquinho. Intrigado com isto Santo Agostinho perguntou ao
menino, o que ele estava fazendo. O menino respondeu: Eu quero ver se consigo
colocar toda a água deste mar neste buraquinho....Santo Agostinho deu uma
gostosa gargalhada e disse ao menino: Deixe de ser louco, menino! Você nunca
vai conseguir isto! Mais louco é você, Agostinho, que está querendo
colocar Deus no buraquinho de sua cabeça!
De outro modo, quando Deus deu seu nome a Moisés, dizendo: "Assim
responderás aos filhos de Israel, quando quiserem saber quem enviou você a
eles, responderás: "EU SOU enviou-me a vocês."
"Eu sou" virou substantivo, não é
verbo conjugável. Não tem passado, nem futuro. Chamando-se "Eu sou"
Deus estava se identificando como aquele que está fora do tempo, de todas as
limitações materiais, temporais e mentais humanas. É outra realidade. O sentido
de toda realidade.
DEUS É INATINGÍVEL! NÃO TEMOS COMO CAPTÁ-LO! NEM COMO APRISIONÁ-LO
EM CATEGORIAS HUMANAS.
4. CRISTO RETRATO DE DEUS
Um dia, quando Jesus
estava falando do Pai e o apóstolo Felipe lhe pediu: "Senhor,
mostra-nos o Pai e isso nos basta. Jesus respondeu: Faz tanto tempo que
estou no meio de vocês e você ainda não me conhece, Felipe? Quem me
viu, viu o Pai... Você não acredita que eu estou no Pai e o Pai em mim?"
(Jo14,8-11)
(A tradução aqui, não está correta. Devia ser:
"Você não acredita que eu sou o Pai e o Pai é eu?")
Em outra ocasião
Jesus deixou isto mais claro quando disse: "O Pai e eu somos UM"
(Jo.10.30) (O que, dito em tradução mais correta seria: "O Pai e eu
somos a mesma pessoa". Pessoa, aqui, tomada em sentido popular e não
teológico).
Em Cristo, então, Deus se revelou a nós e nele
vemos Deus e podemos entender humanamente, quem é Deus. E quanto mais
estivermos identificados com Ele, melhor podemos entender a Deus, como ele é,
não em conceitos e imagens materiais, mas direta, real e pessoalmente como Ele
é.
"Vocês não conhecem, nem a mim nem a meu Pai.
Se vocês me conhecessem, conheceriam também meu Pai" (Jo.8,19)
5. DEUS A PARTIR DE SEU RETRATO
Jesus, então, é a
tentativa de Deus se revelar a nós. Jesus é seu retrato. Então, até certo
ponto, é fácil conhecer a Deus. É só conhecer Jesus. E como conhecer Jesus?
Ele mesmo disse: Vendo o que Ele fez, e ensinou. E o que Jesus fez e
ensinou? Podemos resumir o retrato de Deus, revelado em Jesus Cristo
em 5 traços:
5.1.
P A I
Pai, ou PAPAI, é o modo mais
comum, carinhoso o frequente de Jesus se dirigir a Deus. E em dois momentos este
relacionamento adquire característica mais marcantes e emotivas: Quando,
respondendo ao pedido dos Apóstolos, que se emocionam, vendo seu modo de rezar,
pedem-lhe que os ensine a rezar e Ele nos deu este tesouro, que se
chama: "PAI NOSSO".
Nesta oração, mais do que palavras
que expressam UM momento de relacionamento íntimo de Jesus com o Pai, Ele
nos deu o sentido vital de nosso relacionamento com Deus, vendo-o como: Deus, a
quem devemos a vida, todo respeito e obediência. Em quem devemos depositar toda
confiança. Esperando dele proteção e perdão.
Em lugar nenhum Jesus mostrou
melhor como ele via seu relacionamento com Deus como Pai: resumidos
no seu amor previdente, carinhoso e misericordioso, do que quando contou a
parábola do Filho Pródigo. (Lc. 15,11-24)
5.2. AMOR
São João não viu modo melhor de
resumir o rosto de Deus, revelado em Jesus do que chamá-lo Amor: "Quem não
ama não conhece a Deus, por que Deus é amor e quem ama permanece em Deus e Deus
nele" (1Jo.4,7-16).
"Assim Deus amou o mundo ao
ponto de nos dar seu filho unigênito, para que todo o que nele crer, não
morra mas tenha a vida eterna". (Jo. 3,16) (Ou: Deus amou tanto o
mundo que veio em forma de filho unigênito ao mundo)
Deus não podia dar-nos maior prova
de amor do que dando sua vida por nós: "Não existe maior amor do que
dar a vida por seus amigos. Vocês são meus amigos" (Jo.15,13).
5.3.
LIBERTADOR
Na minha opinião não há traço mais
forte, que revele quem é Deus do que este.
É o que estamos vendo na história
do Povo de Deus, na primeira leitura da Eucaristia, de uns dias para cá.
Na reflexão de ontem, nós vimos como Jesus se apresenta ao povo, no início de
sua vida pública e aos discípulos de João Batista.
O programa desta etapa de sua
vida, estaria bem resumida num único capítulo: LIBERTAR: CURANDO OS
DOENTES, EXPULSANDO OS DEMÔNIOS, RESSUSCITANDO OS MORTOS. E, finalmente,
através do ato supremo de sua vida, a toda a humanidade, através de sua morte
e ressurreição.
Libertador, além de ser o traço
mais forte do retrato de Deus, revelado em Jesus é o sintetiza,
na minha opinião, todos os demais traços, por que é o modo concreto
de Deus se revelar pai e amor. Por que Pai que ama, mas deixa que seus filhos
permaneçam escravos, podendo libertá-los, não é pai, nem amor verdadeiro.
5.4
JUIZ
Sob este aspecto, parece que o
Deus no Antigo Testamento era mais severo, duro e rigoroso, infringindo
castigos pesados ao povo, quando rompiam a Aliança. Provas desta
maior severidade de Deus, são: Dilúvio, Sodoma e Gomorra e a Torre de Babel,
além dos duros castigos infligidos ao povo, quando este não cumpria o que
havia prometido. Este Deus
aparece mais como vingador e juiz.
O Deus revelado em Jesus em o
Novo Testamento, se declara, como vimos, no evangelho de hoje, manso e humilde
decoração (Mt.11,29) Não aceita a atitude de seus Apóstolos que querem atear
fogo numa cidade samaritana, que não quis receber Jesus, a caminho de
Jerusalém. (Lc.9,52-54) Defende a paz, declarando felizes os mansos de
coração, os misericordiosos, os que promovem a paz (Mt,5,5.7.9). Faz de
seus discípulos missionários anunciadores da paz. (Lc. 10,5.-6). Proíbe a
vingança defende o perdão, (Mt,5,21-26) e faz do amor ao inimigos a maior
prova do amor ao próximo (Mt.5,43-47). Defende a humildade dizendo que os
primeiros serão os últimos e os últimos serão os primeiros (Lc 13,30) e
falando que quando formos convidados para um banquete não ocupemos os
primeiros, mas os últimos lugares, para que não aconteça que o anfitrião nos
peça para darmos lugar a outras pessoas mais importante (Lc. 14,7-11).
O Deus revelado não faz do
exercício do poder um ato de dominação, mas um ato de humildade e
uma prestação de serviço. Como exemplo gritante disto, fez questão
de entrar solenemente em Jerusalém, montado, não num fogoso cavalo de raça,
como faziam os imperadores, mas num jumentinho (Lc,19,29-40) e
lavou os pés de seus discípulos. (Jo. 13,4-17)
Não queria que ninguém se
deixasse chamar, ou chamasse alguém de mestre, pai, líder, por que um só é
mestre e pai: vosso Pai, que está nos céus. Um só é vosso líder, o
Messias. E vós sois todos irmãos. "O maior entre vocês deve ser aquele que
serve. Quem se elevar será humilhado e quem se humilhar será exaltado" (M.23,8-12)
Jesus critica o exercício
do poder e propõe uma nova forma de governar: "Vocês sabem que os
governadores das nações têm poder sobre elas e os grandes têm autoridade sobre
ela. Entre vocês não deverá ser assim. Quem de vocês quiser ser grande deve
tornar-se o servidor e quem de vocês quiser ser o primeiro deve ser o
servo de todos. Pois o filho do homem não veio para ser servido, mas para
servir e dar sua vida como resgate em favor de muitos".(Mt.20,29-34)
Mas este Deus manso,
humilde, servidor, não impede Jesus de condenar duramente a hipocrisia dos
fariseus e ameaçá-los: "Ai de vós:doutores da lei e fariseus hipócritas!(Mt.23,1-39;
Lc.11,37-53)
Não o impede, também de
armar-se de cordas e expulsar os vendilhões do templo: "Esta casa é casa
de oração e vocês fizeram dela um covil de ladrões!"(Mt.21,12-13
;Lc.19,45-46)
6. DEUS E SÃO CAMILO
DE LELIS
Hoje celebramos a festa de São Camilo de
Lelis, nascido na Itália, em l550. Tinha um coração abrasado pela caridade,
principalmente para com os pobres e doentes. Levado por esta caridade
chegou ao exagero de afirmar: "Ainda que não se encontrassem
pobres no mundo, deveríamos procurá-los e desenterrá-los para lhes fazer o bem
e praticar a misericórdia para com eles". Nos pobres e doentes via a
própria pessoa de Cristo. Morreu aos 64 anos de idade. Assim São Camilo foi, para nós não só imitador. Não
só seguidor. Mas continuador da missão de Cristo, de ser retrato do amor
libertador de Deus, na sua obra de curar todo tipo de doenças,
libertando de todo tipo de mal. Assim, como Cristo, foi revelação, em
realização concreta do amor libertador de Deus.
7. DEUS E OS RIBEIRINHOS
Do que acabamos de refletir, decorrem quatro
compromissos para os Ribeirinhos:
7.1.
SEM CRISTO, NADA: que o Ribeirinho não caia na
cilada de querer descartar Deus de sua luta para sair da situação de excluído em
que se encontra. O interesse e a "jogada" dos sem Deus é justamente
esta. Eles conhecem a força revolucionária de Cristo!....
7.2.
DEUS-AMOR: Deus ama a todos. Mas está do lado e comprometido
com os excluídos, entre os quais os Ribeirinhos. Ele nos ama e não concorda com
a situação de exclusão em que eles vivem. Se esta situação não muda, não é
por culpa de Cristo, mas por culpa nossa: de nossa Igreja, que fala,
mas não faz, de nossos políticos corruptos, de nossos governos, mancomunados
com o sistema capitalista, que exclui.
7.3.
A UNIÃO FAZ A FORÇA: Assim como sem Cristo, nada, assim também
sozinhos, nada. É preciso formar grupo, pensar em grupo, planejar em grupo,
agir em grupo e...se for o caso...errar em grupo! Mas sozinhos, nada!
7.4.
AÇÃO MISSIONÁRIA: O Missionário continua com a mesma
função de Moisés. Na liderança do processo de libertação do Povo Judeu da escravização
pelo Egito. Deve mostrar esta imagem de Deus, conscientizar o povo de sua força
e ajudá-lo a se unir, planejar, conduzir a realização deste processo de
libertação.
Peçamos a Cristo seja nossa
luz e nossa força de união e de ação, por Maria, sua e nossa mãe.
MARIA, MÃE DOS RIBEIRINHOS, ROGAI
POR NÓS !
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