sexta-feira, 25 de novembro de 2011

O EVANGELHO NO CORAÇÃO DA AMAZÔNIA

Caros Irmãos e Irmãs, a partir de agora iremos conhecer como a Missão começou...

1. 20 anos de Missão já é uma história


Introdução:


Há 20 anos um grupo de leigos orientados por um missionário começaram um trabalho de evangelização para uma população ribeirinha, na região do baixo rio Madeira Diocese e município de Porto-Velho e do rio Mamoré, município e diocese de Guajará-Mirim, ambos no estado de Rondônia.

         Muitas histórias, não fazem história, e caem no esquecimento, na sociedade e na Igreja porque não puderam, não souberam, não quiseram ou, simplesmente não foram escritos. Ficaram ao vento... no tempo... e o tempo e o vento levaram... ao desconhecimento.

         A história, como a renda, é produzida principalmente pela mão de obra escrava, de salário mínimo, mas apropriada, transformada no mais valor da escrita, virando História, na mão de uma minoria, a elite letrada. Assim foi com os negros, os índios, os excluídos... os sem história.

         Não vamos deixar que seja assim, seguindo o exemplo e conselho do poeta.

“Todos cantam sua terra, também vou cantar a minha nas débeis cordas da lira, hei de fazê-la rainha”. (Gonçalves Dias)

         É glória de Cristo e justiça para quem a construiu escrever sua história é só para eles, simplesmente para ele que vamos, depois de 20 anos, escrever a história do que se sonhou, se fez e se sofreu em sangue, suor e lágrimas das alegrias da evangelização de uma parte do coração da Amazônia.

1. HISTÓRIA


1.1. A pré-história o sonho projeto louco de um santo chamado Afonso.


         Afonso Maria de Liguori, nascido e criado em Nápoles, Itália, em 1696-1787, de família nobre. Um gênio para sua época, uma vez que poeta, músico, teatrólogo, autor de mais de 100 obras escritas. Aos 19 anos já era advogado, formado nos dois direitos, civil e religioso. Revoltado contra a corrupção política, jurídica de seu tempo, que deu, contra seu parecer ganho de posse de um ducado, a um príncipe Austríaco, contra um príncipe Italiano, resolveu abandonar tudo e tornar-se padre e trabalhar com os pobres da cidade de Nápoles. Conseguiu agrupar, dar assistência e organizar na periferia da cidade mais de 70 comunidades que foram chamadas “Capelle Serotine”, ou Comunidades Boca da Noite: grupos de todos os tipos de gente, considerada a “ralé” da sociedade. Ele os reunia, de tardezinha em becos, galpões, garagens da periferia e lhes dava instrução e assistência religiosa. O movimento começou a preocupar as autoridades civis, parecendo projetos de “pequenas células”, conscientização e agitação de massas. Enciumava as autoridades religiosas, parecendo concorrência de influência e poder.

         Afonso estressado, decidiu “dar um tempo” retirar-se do “local do crime”. Foi mais para o sul Scala, na solidão das montanhas. Ali encontrou uma monja Soror Madre Maria Astarosa, que, apontando para casebres no alto das montanhas onde viviam famílias produzindo leite e peles de cabras, lhe disse, adivinhando profeticamente o futuro: “Afonso Deus não te quer em Nápoles, mas aqui, cuidando destes pobres cabreiros, que não têm ninguém por eles.”

         Sem querer e sem saber a monja foi intérprete do chamado de Cristo a Paulo: Vai! É para longe, é para junto dos pagãos que hei de te enviar (At 22,21). Numa primeira reação, contra este totalmente descabido convite, Afonso pensou, consigo mesmo eu: nobre, de Nápoles, trabalhar aqui nestas montanhas, com cabreiros ?!...Só pode ser sonho louco de uma monja...

         Mas voltando para casa, ouvindo o silêncio de si mesmo, compreendeu no convite louco da monja o apelo de Cristo, que dos pobres, levava aos excluídos, “Sai! Vai! É para longe que vou te enviar! E um dia, no escuro da noite, para não ser notado, Afonso fugiu de Nápoles”.

         Decisão e exemplo forte e cativante que luziram a outros sonhadores utópicos, arrojados, que acreditam no impossível. Formou-se um grupo chamado: Missionários do SS. Redentor, que existe até hoje: os chamados Redentoristas. Os mesmos que cuidam do Santuário de Nossa Senhora Aparecida e estão espalhados em quase todos os Países, Estados entre os quais Amazonas e, cidades  de todo o  Brasil.


1.2. HISTÓRIA


1.2.1. Uma História mal contada, um erro de caminho.


         Como tantos outros, atualmente mais de 10 mil, Afonso continua nos seus filhos no transcorrer dos quase 300 anos de existência da Congregação, também senti o apelo de Cristo a Afonso e decidi segui-lo. Só que me disseram que a Congregação dos missionários Redentoristas, tinha por destinatários de sua missão os “pobres e abandonados”, como Afonso os tinha em “Nápoles”.

         Só depois de 25 anos do Missionário Redentorista quando a Congregação completou 250 anos de existência, e um Professor de uma Faculdade em Roma, veio nos dar um curso sobre a verdadeira origem da Congregação é que fiquei sabendo da história verdadeira. Afonso já cuidava dos pobres e abandonados, quando trabalhava e com grande sucesso, em Nápoles. Decidiu abandonar o pobre e abandonado na e da cidade (sistema) para ir trabalhar com o que fora excluído jogado fora pela cidade (do sistema). A Congregação e eu também, ainda estávamos em Nápoles.

         Fora: Vigário paroquial na Penha (São Paulo) 1958 e Goiânia (Campinas) 1959-1960 Missionário da cidade em São Paulo (1961-1967). Fez atualização pastoral em Roma (1968). Voltei às missões urbanas de 1968 a 1973. Fiz pós-graduação em Ciências Sociais (1971 a 1974). Fiz mestrado ( 1975 a 1977) lecionei em Seminários Maiores e PUC de Campinas 1974-1990. Nunca trabalhei, nem com pobres e abandonados, muito menos com Excluídos e nunca sai de “Nápoles”...

         As cidades onde vivera e trabalhara foram: São Paulo, Goiânia, Roma, Araraquara. Só “Nápoles”!...


1.2.2. Em busca do caminho de Afonso.

         Entrei em crise, na qual já estava desde 1965, na reviravolta do Concílio Vaticano II, quando a Igreja fez opção pelos pobres, depois pelos oprimidos e explorados e, finalmente pelos excluídos. Me convenci de que não estava no lugar certo. Vivia na hipocrisia de uma vida ambígua, traindo minha vocação trabalhando com rico e dizendo que Cristo me chamara para trabalhar com pobres e abandonados. Depois de descobrir que Afonso, o fundador, modelo e inspirador abandonou o pobre para ir ao excluído, decidi mudar de rumo seguir Afonso e ir em busca do excluído.

         Mas como e onde achá-lo.

         Coloquei-me nas mãos de Cristo, sob a luz do seu Espírito e deixei que ele agisse. E ele, como sempre, cumpriu sua promessa.

         As Irmãs da Congregação Santa Marcelina, com as quais eu trabalhava há 12 anos, no Colégio Santa Marcelina, Perdizes (S.P), quando sua Congregação completou 150 anos me pediram para vir a Porto Velho, participar das celebrações do Jubileu, falar a seus professores, divulgar a Congregação e conhecer suas obras, entre os quais uma casa para tratamento de hanseníase. Durante este período encontrei o Padre: Ludovico, Comboniano, pároco da Igreja Nossa Senhora das Graças, e Capelão do leprosário das Irmãs. Durante os bate-papos, após o almoço, Padre Ludovico, contando-me sua história de vida, disse que ficara Padre, na Itália, para vir trabalhar no Brasil, onde já estava há 15 anos. Em Porto Velho, seu sonho era trabalhar no “Beiradão”. Mas nem o bispo, nem os seus superiores o deixaram. Quando ouvi falar “Beiradão”, senti que era a fisgada vocacional a me indicar o caminho do excluído, que procurava. Procurei me informar melhor sobre o tal “Beiradão” e ele me disse que era o nome, meio depreciativo dando aos habitantes as margens dos rios da região, em cujas margens moravam famílias esparsas, distantes e por isso isoladas totalmente dasassistidas, tanto pela sociedade, como pela Igreja. A Igreja só as visitava uma vez por ano, nas famosas “desobrigas”.

         Padre Ludovico a esta altura não tinha o mínimo conhecimento da minha crise procura e nem me abri com ele neste sentido, mas senti que, sem saber ele fora o instrumento que Cristo usava para me fazer seu apelo. Isto acontecia na Semana Santa de 1989.

         Voltei para São Paulo e continuei meus trabalhos, no colégio e na PUC de Campinas.

         Para as férias de Julho eu dei a idéia e as Irmãs toparam: levar os alunos para uma experiência missionária nas obras delas em Porto Velho no tempo: OSEM, Escola Primária e Hospital dos hansenianos. Foi sucesso. Nos dois anos seguintes 1990 e 1991, continuei o mesmo trabalho. Já sozinho por minha conta, na Semana Santa, nas obras das Irmãs.

         E em Julho convidava alunos e desde 1990 comecei, também a convidar leigos, alguns dos quais trabalharam comigo em encontros, retiros e outros movimentos.

         Na Semana Santa de 1990 com os leigos fizemos, um mês de evangelização fundamental no bairro de Candeias, hoje município.

         Este primeiro grupo de missionários foi composto pelas seguintes pessoas: Alice, Dolly, Gil, José Anselmo, Pedro Ganco, Aparício, Georgina, Walter, três estudantes do Colégio das Irmãs Santa Marcelina, e eu.

         Nas Semanas Santas de 1990 e 1991 procurei conhecer as paróquias de Nossa Senhora Aparecida e de São João Batista respectivamente nos distritos de São Carlos e Calama as margens do Rio Madeira que, como disse o Padre Ludovico eram as duas paróquias que compunham o Beiradão, para onde pensávamos que Cristo nos chamava. Neste período procuramos consultar o bispo da Diocese Dom José Martins da Silva para pedir-lhe licença de vir trabalhar nesta área de sua diocese.

         Nesta visita o bispo me disse: “Alegro-me ao saber que os redentoristas pretendem vir para trabalhar na minha diocese”! Ao que lhe respondi “Excelência, meu pedido nada tem a ver com minha Província. Isto é problema de pedido sem a Província. Vim pedir-lhe licença em meu nome pessoal. Sou eu, Padre Viana, que quero vir trabalhar aqui”. Ao que ele disse: mas como é que o senhor virá, se aqui não há uma comunidade da Congregação? (Em geral padres de Congregação só trabalham em comunidades com três padres). Eu lhe disse: vou pedir licença ao Conselho Provincial. Ele pode abrir uma exceção, como já aconteceu em outros casos excepcionais. E o bispo voltou a perguntar: “E se o Conselho Provincial não aprovar seu pedido, nem lhe der licença”? Respondi: “Apelo para o Conselho e Governo Geral, que está acima do Provincial e deu resposta favorável a casos semelhantes”.

         Então o bispo insistiu: “E se o Governo Geral não der licença”? Respondi: concluindo: “Eu venho assim mesmo!

         O bispo sorriu, como quem pensasse: Este está decidido mesmo! Não tem jeito! E me aceitou na sua diocese para a missão no Beiradão.

         Com o Conselho Provincial a coisa foi mais fácil não só aprovou, mas elogiou a decisão, dando sua bênção para o trabalho. Eu continuava Redentorista, inscrito na Província de São Paulo, como membro da casa Provincial, enviado para uma, então, experiência, hoje, frente missionária.

         Pela voz das autoridades, Cristo deu sua aprovação final à minha decisão e projeto.


1.2.3. O SONHO COMEÇA A ACORDAR E SE TORNAR REALIDADE


         Nestes três anos (1989 – 1991) que antecederam minha mudança definitiva para o campo missionário do “Beiradão” eu aproveitei para me preparar:

         - Consultando o bispo e o Conselho Provincial, como já falei;

         - Consultando padres e leigos amigos;

         - Procurando conhecer a área da missão, quando ia na Semana Santa;

         - Rezando, refletindo e pedindo a luzes e forças do Espírito Santo para acertar o caminho.

         Esqueci de dizer que o bispo, depois que aprovou minha vinda, mandou-me consultar o Padre Danilo que era o único padre, que atendia as duas comunidades do “Beiradão” para ele me indicar de qual paróquia eu deveria cuidar. Padre Danilo me indicou a paróquia de São João Batista, Distrito de Calama.

         Em 1991, um ano antes de minha decisão final, como nos anos anteriores, coordenei a última missão leiga nas duas paróquias do “Beiradão”.

         Esta foi uma missão preparatória para minha vinda definitiva: fizemos um levantamento Sócio-Religioso de toda a área da missão de Calama e uma primeira missão de primeira Evangelização.

         Assim a população estava proximamente preparada para o início de meu trabalho missionário.

         Ainda tive um “Ano Sabático” antes de partir.

         Como e com Afonso abandonei “Nápoles”, em busca do excluído!...

         Era dia 17 de Janeiro de 1992. Eu tinha completado 62 anos! Trabalhei em Calama durante 14 anos de 1992 a 2005. Já prevendo a possibilidade de ser dispensado pelo bispo, depois deste período antes de partir, para meu ano Sabático, em 2006, consultei os bispos de Humaitá e de Guajará-Mirim sobre a possibilidade de ir trabalhar na área ribeirinha de suas dioceses. Ambos aceitaram. Mas haveria também a possibilidade de pedir para trabalhar na prelazia do Coari (AM) onde também temos pastoral ribeirinha, mas tanto Humaitá, como Coari nos pareceram já ter maior atendimento e pastoral ribeirinha mais organizada. Guajará-Mirim ainda estava em fase de Pastoral de desobriga. Por isso optei por ela. Na 5ª feira Santa de 2007 cheguei a Guajará-Mirim.

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