terça-feira, 24 de maio de 2011

UM HOSPITAL FLUTUANTE


Antes de começarmos falar sobre a História da Missão, achamos necessário contar a história do BARCO-HOSPITAL, principal instrumento de trabalho, especialmente no setor da saúde.

COMO SURGIU:
     O BARCO HOSPITAL é fruto de três convicções:
Barco - Hospital Stos Marcelina - Afonso
    Primeira: a evangelização, para atingir um ser bi-dimensional, tem que ser também bi-dimensional, ou seja, integral, atingindo o ser humano em suas duas dimensões transcendental, religiosa e espiritual e em sua dimensão material, corpo e saúde, como já vimos.
    Segunda: tal trabalho, a nível de saúde, é responsabilidade primeira do estado, ou governo municipal, estadual e federal. Mas quando este é omisso, impotente, ou irresponsável, tal responsabilidade recai subsidiaria e paralelamente  sobre as Igreja e a Missão.
     Terceira: Acresce a esta duas a situação de total abandono em que vive a população ribeirinha, agravada por sua localização geográfica de distância, isolamento e de difícil acesso, como é o caso, como já vimos, da população, destinatária do trabalho missionário de atendimento e assistência, na área da saúde.
    Em se tratando de uma população distante e isolada, compreendeu-se logo que um trabalho fixo não satisfaria aos objetivos desejados, atingindo, então só uma pequena minoria. Exigia, então, um trabalho, como o da assistência religiosa:  móvel e personalizado, de casa-em-casa. Daí surgiu, imediatamente, a consciência da necessidade de um Barco-Hospital, com consultório médico, para, até, pequenas cirurgias, um gabinete dentário, não só para extrações, mas para recuperação, um laboratório, para exames de rotina e farmácia.
      TEMPO: Para as ideias se concretizarem em ação concreta demorou-se seis anos, começando-se o trabalho de construção em Maio, sendo concluído em Agosto de 1999.
    MATERIAL: Tal barco foi todo construído com madeira itaúba preta, própria para barcos, por que resistente a chuva e ao sol.
    TAMANHO E MEDIDAS: por sua função de atendimento a saúde e as medidas fornecidas por seus respectivos profissionais: médicos, dentistas,  bioquímicos, vigilância sanitária, além do espaço, exigido pelo alojamento de todo este pessoa e tripulação, foram exigidos 19 metros de comprimento por 05 metros de largura. 
    CUSTOS E RECURSOS: Como a missão não tem recursos, nem fonte de renda, tal empreendimento só seria possível com ajuda externa.
  Incluindo voadeira, com o motor, e conjunto gerador, só a construção do barco, com material e mão de obra, orçou em 120.000,00, sem contar os equipamentos. Tal quantia foi doação do "Adveniat", entidade dos católicos alemães, para ajuda às obras sociais de países pobres. (25 %).
A "Central do Dízimo", Entidade filantrópica de médicos não católicos colaborou com outros 25% e os outros 50% foram doações de amigos e colaboradores de São Paulo.
     As duas cadeiras de dentista, com o aparelho de Raio X e todos os aparelhos do laboratório foram doação da Prefeitura e Câmara de Vereadores de Pederneiras, minha cidade natal.
     Aproveitamos a ocasião para agradecer, de coração, a todos os que colaboraram neste empreendimento.
Missão do ANAMPRA - Semana Santa em 2000


Missão Saúde ANAMPRA
    USO: Como vemos, então, este barco só pode ser usado para o fim a que foi destinado, ou seja: o atendimento à saúde dos ribeirinhos. Não é, pois, barco de turismo, nem para transportar passageiros, ou outros fins. Depois de pronto, no início, este trabalho de atendimento à saúde dos ribeirinhos era  feito com ajudas espontâneas de amigos e colaboradores. No Governo de Ivo Cassol, foi feito um convênio com a ANAMPRA (Associação Nacional de Apostolado Missionário para Ajuda às Populações Ribeirinhas Amazônicas) que criamos para atrair e administrar recursos para este trabalho da missão. No atual Governo de Confúcio Moura, dependendo dos recursos que ele nos conceder, pretendemos, de dois em dois meses, visitar todas as famílias ribeirinhas as margens dos rios Mamoré, Guaporé e afluentes, para atendimento à sua saúde.
O  BRASÃO
    Logo à entrada do Barco-Hospital há um brasão, ou escudo que, como o nome, pretende resumir os motivos e a história, que deram origem a esta missão.
    Neste brasão estão unidos dois Brasões: o da Congregação Redentorista, da qual faço parte e o da Congregação das Irmãs Marcelinas, em cujo colégio de São Paulo, Perdizes, eu trabalhei 12 anos.
    O Brasão da Congregação dos Missionários Redentoristas é formado por três cruzes, encimando três montes, lembrando o calvário, onde foi crucificado Jesus e os dois ladrões e onde se deu a COPIOSA REDENÇÃO de TODOS: lema escolhido por santo Afonso, fundador da Congregação Redentorista, contra outra corrente teológica do tempo, que afirmava que a redenção, realizada em Cristo e por Cristo não será suficiente para todos, mas só para pouca gente, escolhida por Cristo.
   O Pe. Viana, como já dissemos conheceu e decidiu-se por esta missão inspirado no projeto de Santo Afonso, que fundou a Congregação para evangelizar os EXCLUÍDOS, ou seja os deserdados, como Cristo, pela cidade de Belém. Para isto ele abandonou 72 comunidades de pobres, que fundara e das quais cuidava, na grande cidade de Nápoles, para ir evangelizar as famílias dos criadores de cabras, que viviam nas montanhas, da cidade de Scala, mais ao sul da Itália, longe umas das outras, esparsas e isoladas, como os ribeirinhos de Rondônia, onde o Pe. Viana escolheu para trabalhar e fundou sua missão.
    Os três montes,com as três cruzes, têm,logo acima um grande olho, dentro de um triângulo, que tradicionalmente simboliza o Divino Pai Eterno e a Santíssima Trindade. A coroa simboliza a realeza de Jesus, confirmada pela sua morte e ressurreição. O lema "Junto dele a salvação é copiosa", ou seja: suficiente para TODOS, é o grito missionário de Afonso e dos Redentoristas, que motiva e dá sentido à sua filosofia de vida.
    A Congregação das Irmãs Marcelinas tem, também um brasão muito semelhante ao dos Redentorista, formado por um monte, onde está fincada uma cruz, da qual saem duas lanças, lembrando a morte de Cristo, para nossa libertação. 
    Do lado esquerdo de quem olha para o quadro está a letra  "I" de IRMÃS e do lado direito, de quem vê o quadro está a letra "M" de Marcelina.
O  NOME  DO  BARCO
     Depois de pensarmos muito, que nome daríamos ao Barco-Hospital, para satisfazer as exigências da Capitania Marítima, decidimos inventar um nome que unisse as duas razões e resumisse a história que me sugeriram esta missão: a INSPIRAÇÃO do carisma Alfonsiano e a OCASIÃO oferecida pelas Irmãs Marcelinas.
    Eu trabalhava já há 11 anos no Colégio Santa Marcelina, como Coordenador do Departamento de Educação Religiosa e quando esta Congregação completou 150 anos, as Irmãs do mesmo Colégio em Porto Velho me convidaram para vir animar as celebrações deste Jubileu. Aqui, através do Pe. Ludovico, Comboniano, tomei conhecimento da realidade ribeirinha e decidi abandonar, tudo, em São Paulo, como Santo Afonso, em Nápoles e vir trabalhar aqui exclusivamente com os excluídos, na pastoral ribeirinha, primeiramente no Baixo Madeira e de quatro anos para cá no Vale do Guaporé-Mamoré. Eis por que o Barco-Hospital tem o nome de MARCELINA.
    O carisma de Afonso que deu origem a Congregação redentorista foi a INSPIRAÇÃO. Já contamos esta história. Assim temos o nome AFONSO, completando o nome do Barco: S A N T O S:  M A R C E L I N A - A F O N S O.

    Pe. Francisco Lenine Viana Pires CSSR  

terça-feira, 17 de maio de 2011

SENHORA RIBEIRINHA ! ROGAI POR NÓS !

Mais uma Nossa Senhora, na praça, além das inúmeras que já temos?! 
     - Lembre-se do que disse um santo Padre "DE MARIA NUNQUAM SATIS", QUE QUER DIZER: "POR MAIS QUE SE FALE DE MARIA, NUNCA SE FALARÁ O SUFICIENTE !
       1. HISTÓRIA
Eu sou um Missionário Redentorista e se você quiser definir um redentorista, chame-o de "Fissurado de Maria". Seu fundador, Santo Afonso era um consagrado a Maria, desde a juventude. Escreveu o que é, talvez, o maior tratado de teologia mariana da Igreja. Ele exigia que seus padres nunca terminassem uma pregação sem  relacionar o tema com  Ela. Aos redentoristas são os guardiães de vários Santuário Basílicas, consagrados a Nossa Senhora, no mundo: com Altoeting, na Alemanha. Pompéia, a Itália, Aparecida, no Brasil, para citar só alguns. O Papa Pio IX entregou aos cuidados dos Redentoristas o quadro de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro e a Novena, em sua homenagem, composta por eles, é rezada várias vezes ao dia, em todo o Brasil,com grande afluxo de gente. Até linhas novas de ônibus se abrem,em direção às Igrejas onde há estas novenas. Redentorista é assim: quando ele chega num lugar, se aí já existe uma Igreja, ou devoção a Nossa Senhora, ele a faz crescer. Onde não há, ele cria.
   Quando eu cheguei a Rondônia,eu estranhei que aqui fosse dos poucos estados do Brasil, que não tivesse um Santuário dedicado a Nossa Senhora e, sendo um Estado, cortado de rios, com 16 milhões de Ribeirinhos, não tivesse uma Nossa Senhora,  com o título e que fosse sua padroeira. Comecei a sonhar com uma. Em Calama, primeira comunidade ribeirinha onde fui pároco, havia um bom artista. Pedi a ele que me pintasse o quadro de Nossa Senhora dos Ribeirinhos. Dei-lhe algumas dicas. O quadro saiu muito bonito. Foi bento no Santuário de Nossa Sra. Aparecida. O quadro está na Igreja de São João Batista, distrito de Calama, última comunidade do Estado de Rondônia, na divisa com o Estado do Amazonas.
    Quando me transferi para a Diocese de Guajará-Mirim, esta tinha a imagem, muito bonita, de Nossa Senhora dos Seringueiros, mas sem seringueiros, por que os antigos já vieram para a cidade. Encontrei também um escultor boliviano que havia esculpido todas as imagens e quadros da Catedral. Pedi a ele que me esculpisse a imagem de Nossa Senhora dos Ribeirinhos. Dei-lhe as idéias principais e ele começou seu trabalho no começo de Janeiro, terminando-o no dia 2l de Março do mesmo ano.
    A madeira foi tirada de um tronco de Canelão, de 12 metros, do sítio do senhor Armindo Machado de Lima. O artista é Julio Cesar Cunavi Pariqui, que cobrou US$ 300.00 ou R$ 700.00, no valor da época. Tiramos a madeira no dia l0 de Dezembro de 2007. 
2. SIMBOLISMO, EXPRESSÃO E MENSAGEM DA IMAGEM
    Quando pensamos na imagem, assim a descrevemos ao artista: 
- Figura de Nossa Senhora       
- Ao lado de um canoa
- Dentro da qual um pescador, em atitude de súplica. 
 - Nossa Senhora vestida com um manto, que do lado direito imitaria uma rede de pesca e do lado esquerdo, seu manto natural.
    Ao sair da cabeça e do cinzel do artista, a imagem foi tomando sentido, adquirindo simbolismo e se transformando em expressão e materialidade.
2.1. TAMANHO: Um metro de altura por 0,40 centímetros de largura.
2.2. ROSTO: O rosto é um dos pontos característicos deste escultor. Belo. Suave, levemente triste. Misto de ternura, carinho, cuidado e compaixão.
Mãe carinhosa. Medianeira de todas as graças. Beleza de Maria: Cheia de graça. Imaculada.  
Triste ao contemplar a situação de exclusão dos ribeirinhos. (Lc.2,28; Gn. 3,15; Jo .2 )
2.3. O OLHAR DE MARIA VAI ALÉM DA PESSOA DO PESCADOR ESSE ESTENDE MAIS PARA A FRENTE E PARA O LADO: Este carinho, atenção, cuidado, compaixão e socorro de Maria se estende a TODOS OS RIBEIRINHOS ,  mesmo ao que não a conhecem, não a aceitam, nem a imploram. É MÃE DE TODOS OS RIBEIRINHOS. (Jo. 19,25-27 ; 2,1-10; Gn.3,15 ) 
2.4. MARIA ESTÁ FORA DA CANOA, mas muito próxima dela. A REDE DE PESCA AO LADO DIREITO É PARTE DE SEU MANTO.
          Embora em realidade e plano superior, Maria não está alheia, distante, ausente, indiferente e insensível à realidade, problemas e angústias do povo ribeirinho. Ao contrário os conhece, está em íntima, direta e comprometida relação com eles, disposta a ajudá-los na solução dos mesmos.
2.5. SEU BRAÇO E MÃO DIREITA SE ESTENDEM PARA A FRENTE, NUM GESTO E TENTATIVA DE AJUDA E DOAÇÃO.
          Esta ajuda é efetiva e concreta, não meramente teórica e abstrata.
2.6. MARIA SEGURA UM PEIXE NA MÃO ESQUERDA, DANDO-O AO PESCADOR.
          O cuidado, proteção, atenção e socorro de Nossa Senhora, não se exgota, nem é de ordem e dimensão puramente religiosa, moral e espiritual.  INTEGRAL, ou seja: completa, atingindo o ser humano todo:corpo e espírito, saúde, alimentação, meio ambiente etc...
2.7. O PESCADOR SE LEVANTA, TENTANDO ALCANÇAR A MÃO DE NOSSA SENHORA.
          O pescador representa todos os ribeirinhos, para os quais a pesca é necessidade de sobrevivência e atividade característica
          Lembra, também a atitude de súplica deste povo, que, abandonado de todos, procura em Maria sua segurança.
 2.8. NÃO HÁ BANQUINHO PARA O PESCADOR, ELE TEM QUE FICAR EM PÉ O TEMPO TODO.
         A necessidade e o apelo a Maria não admitem interrupção e descanso. Tem que ser contínuo. "Ore sem cessar !" (1Ts. 5,17: Lc. 11.5-10)
2.9.  A MÃO, O BRAÇO E OS DEDOS DO PESCADOR SÃO EXAGERADAMENTE GRANDES, FORA DO NORMAL:
        Este aspecto da imagem tenta mostrar a grande intensidade da angústia e do pedido de socorro do ribeirinho. Angústia e súplica que brotam do mais profundo de seu ser, como fruto de sua situação também de excluído.
2.10. O PESADOR ESTÁ DENTRO DA CANOA, EM CUJO INTERIOR ESTÃO UMA VARA DE PESCAR, UMA ESPINGARDA E UM TERÇADO (FACÃO)
       A canoa, o terçado e a vara de pescar são instrumentos indispensáveis e, por isso, inseparáveis do trabalho do ribeirinho, que lhe garantem a sobrevivência. O terçado e a espingarda são, também, instrumentos inseparáveis e indispensáveis de defesa de quem está continuamente exposto aos mais diversos perigos, de um ambiente repleto das mais diversas ameaças à vida: a mata e  o rio. Estes instrumentos revelam,também, que o ribeirinho está consciente de que ele não pode ficar numa atitude meramente passiva, esperando que Cristo, Maria e os irmãos façam tudo, mas deve fazer a sua parte, ou tudo o que pode, para resolver seus problemas.
2.11. DOIS PEIXES PEQUENOS DENTRO DA CANOA.
       Mas sabem, também, que, por mais que façam, não conseguem muita coisa. Só dois  pequeninos peixes ... Só com seus instrumentos, técnicas, esforços e trabalhos humanos, não conseguirão tudo o que pretendem e precisam. Necessitam também da ajuda de  Cristo, Maria e da Comunidade, Somos e devemos VIVER EM E COMO COMUNIDADE. Sozinhos somos e conseguimos pouco. Com Cristo, Maria e a Comunidade, multiplicarmos o pão que dará para todo mundo e ainda sobrará. (Lc.5,1-11;  Jo.6,5-15 )
2.12. CANO  
        Único meio de transporte do ribeirinho. Muitas vezes também sua casa, principalmente nas longas viagens.
2.13. RIO
        É sua única estrada. Junto com a terra e a mata é sua fonte de alimento.
2.14. RACHADURAS NA IMAGEM
        Falhas naturais da madeira, que não quisemos corrigir. Ribeirinho é excluído, por isso pessoa e vida rachada, violentada, incompleta  e inacabada.
2.15. ASPECTO RÚSTICO, NÃO BURILADO, DEIXANDO APARECER AS MARCAS DOS GOLPES DO CINZEL.
        Realidade dura da vida ribeirinha. Consequência de sua situação de exclusão e abandono.
Esta é a imagem da Mãe Ribeirinha, que será colocada em lugar de destaque no Barco-hospital. Que ela seja, de fato a lembrança da Mãe querida. E que ela seja a garantia de um trabalho de saúde integral para todos os ribeirinhos. Assim seja!

ORAÇÃO A NOSSA SENHORA DOS RIBEIRINHOS

MÃE RIBEIRINHA
NOSSOS RIOS NOS LEMBRAM: O BATISMO DE JESUS -NOSSO BATISMO. O MILAGRE DA CANÁ. A VIDA PÚBLICA DE JESUS: EVANGELHO ÀS MARGENS DE RIOS E LAGOS.
COM TEU EXEMPLO E AJUDA NOS COMPROMETEMOS: VIVER O CRISTO. VIVER COMO CRISTO. VIVER POR CRISTO.
ABENÇOA NOSSAS FAMÍLIAS: QUE ELAS REVIVAM TUA FAMÍLIA. PROTEGE-NOS! CUIDA DE NOSSOS DOENTES E IDOSOS. ENVIA-NOS MAIS MISSIONÁRIOS.
QUE NUNCA NOS FALTE O PÃO MATERIAL E ESPIRITUAL, O VINHO DA PAZ, DA JUSTIÇA E FRATERNIDADE. TRANSFORMA-NOS E NOSSA SOCIEDADE, DA ÁGUA DE NOSSA HUMANIDADE, PARA O VINHO DA TUA DIVINDADE, PARA QUE CHEGUEMOS UM DIA, À VIDA PLENA E DEFINITIVA.
M Ã E   R I B E I R I N H A,   R O G A I    P O R   N Ó S  !

(Com aprovação eclesiástica Geraldo Verdier. Bispo Diocesano de Guajará-Mirim). 

sábado, 7 de maio de 2011

A MISSÃO RIBEIRINHA

O QUE FAZEMOS !

  Vimos, no texto anterior o que queremos dizer quando dizemos "Missão Ribeirinha de Guajará-Mirim". Vimos, depois de estudarmos os diversos aspectos de sua realidade, que se trata de verdadeiro campo missionário, no mais original sentido da palavra. Realidade onde, podemos dizer, o Cristo ainda não nasceu e espera alguém, que, enviado por ELE, o ajude a nascer para Cristo. Num segundo aspecto, podemos dizer que esta é uma população de excluídos, esperando alguém, enviado por Cristo que lhe diga e faça, como Cristo disse e fez ao cego:  "Vem para o centro !"E agora, o que fazer?!  Como fazer?
Estas são as perguntas que estamos tentando responder, em quatro anos de missão. Não temos certeza de termos encontrado ainda "o que" e o "como". Você pode ajudar !... 

1.   EVANGELIZAR E NÃO BATIZAR

    Quando chegamos à área, desconhecendo totalmente a situação da população, iniciamos um trabalho nos mesmo moldes do que fazíamos no sudeste: pastoral sacramentalista, baseada em celebrações da eucaristia e administração dos sacramentos. Logo, porém, tomando pé na realidade nos convencemos de que tal pastoral estava totalmente furada por que a população não tinha o mínimo dos pré-requisitos exigidos, pelos sacramentos, em especial uma opção livre, pessoal, esclarecida e consciente por Cristo e seu evangelho.
Me convenci, então, de que, o que Paulo disse para si, valia para mim: "Cristo não me enviou para batizar, mas para ANUNCIAR O EVANGELHO !" (1Cor.1,17). 
Também me convenci de que, no estilo de desobriga, era possível o povo se reunir uma vez por ano, motivado pelo interesse dos sacramentos pelos quais se sentia obrigado. Mas pela situação geográfica de suas casas, muitíssimo distantes umas das outras, não tinha a mínima possibilidade de se reunir mensalmente para ouvir a palavra de Deus e um serviço de evangelização lenta, gradual e progressiva. Foi então que me decidi por um trabalho de evangelização CARA-A-CARA, DE-CASA-EM-CASA e não de sacra mentalização a-toque-de-caixa. E é isto que faço. Vou de voadeira, paro em cada casa, faço uma pequena celebração, na qual a parte mais importante é o momento da palavra, quando procuro, de um modo bem simples e bem resumido, desenvolver uma evangelização, desenvolvendo os pontos elementares, fundamentais do Primeiro Anúncio (Quérigma) do Evangelho em três momentos, que intitulo Viver O Cristo: Experiência e Vivência dos Princípios da FÉ: Creio em Deus-Pai. Viver COMO Cristo: Experiência e Vivência dos valores, normas e padrões de comportamento, que o Cristo ensinou e viveu: Mandamentos. Viver POR Cristo: Experiência e Vivencia de uma vida totalmente dependente de Cristo, que disse: "sem mim nada podereis fazer" (Jo. 15,5): Sacramentos, oração, vida espiritual.
     Este é nosso trabalho, atualmente. Depois de terminadas estas três etapas, vamos começar a pensar nos sacramentos. a começar do batismo.

2. A MISSÃO LEIGA DE JULHO

    Com a Igreja e a partir da prática, sempre estive convencido de que o trabalho do Padre é muito importante e necessário, por que com condição de maior continuidade e regularidade. Mas o trabalho do leigo é de igual importância e necessidade. Como o povo, ele vem do chão da mesma vida e a força de sua palavra é o testemunho do dia-a-dia. Por isso sua palavra às vezes, tem mais força de convicção do que a do padre.
    Convencidos disto, desde o começo convidamos leigos para virem dar seu testemunho através da evangelização. A MISSÃO LEIGA.
É trabalho voluntário que acontece todos os anos, durante todo o mês de Julho, incluindo viagem de ida-volta e o trabalho nos rios e ramais. Esta evangelização segue o mesmo estilo e conteúdo da evangelização do Padre. Mesmo método de casa-em-casa, que o padre, depois, continua durante os outros meses do ano.

3. EVANGELIZAR O CORPO TAMBÉM É PRECISO

   O Ser humano não é um ser uni-dimensional. Só espírito. Nem uma juxta-posição corpo e espírito, mas uma integração bi-dimensional CORPO-ESPÍRITO. 
Nenhuma ação, tendo  endereço humano, pode ficar só numa dimensão, sob o risco de se tornar inócua e até prejudicial, mas  tem que atingir as duas. Por isso desde o início da missão, além da preocupação como espírito e sua evangelização religiosa, sempre tivemos preocupação com a saúde. Para isto, sentimos a necessidade de construir um Barco-Hospital, de 19m x 05 metros, com dois gabinetes dentários, consultório médico, laboratório e farmácia, para levar atendimento à saúde dos ribeirinhos da área, realizando, como a evangelização, um atendimento personalizado, casa-por-casa. Uma equipe de agentes de saúde: médicos, dentistas, bioquímicos, oferece seus serviços voluntários, por enquanto uma vez por ano, durante uma semana. Mas já estamos vendo a possibilidade de fazer com que este atendimento seja de dois em dois meses, dependendo da ajuda que o Governo oferecer. E o interesse não é só cuidar da medicina curativa, mas também e especialmente da medicina PREVENTIVA, como é projeto do Governo Federal. 
      Terminamos, então, com um apelo. Se você sentir o chamado de vir somar forças neste trabalho, seja na área da evangelização religiosa, seja na área da missão-saúde, procure-nos. Teremos o maior prazer em acolhê-lo e atendê-lo. Precisamos de você com o que você puder colaborar, por que, como você viu, "A messe é grande, mas os operários são poucos" (MT.9.37). Venha conosco! O povo pobre e carente de Cristo e de saúde, nas margens dos rios e ramais espera por você. Cristo o chama! O que espera para responder? Venha!

sexta-feira, 6 de maio de 2011

A REALIDADE RIBEIRINHA


Já mencionamos e tocamos em alguns pontos periféricos, relativos à realidade ribeirinha, onde trabalhamos. Ainda falaremos sobre sua história. Hoje gostaríamos de dar uma fotografia mais detalhada da mesma, em alguns de seus aspectos mais fundamentais.

I.  ONDE ESTAMOS ?

     A Missão Ribeirinha, de que falamos, localiza-se no que muitos chamam "o coração da Amazônia" e, talvez, da América Latina: o estado de Rondônia, a 15 minutos da Bolívia, bastando, para isto, tomar uma "voadeira", (lancha com motor de popa) e atravessar o rio Mamoré. Estamos no município e diocese de Guajará-Mirim. Porto Velho, a capital do Estado dista 375 quilômetros. Os limites desta Diocese, com relação à Bolívia, são formados por 1.500 quilômetros de rio: Rio GUAPORÉ, que vem do Mato Gross e que, ao se encontrar com o rio Mamoré, oriundo da Bolívia, perde o nome e passa a chamar-se MAMORÉ, dando o nome ao VALE DO GUAPORÉ-MAMORÉ, UM DOS VALES MAIS RICOS EM BIO-DIVERSIDADE DO BRASIL E DO MUNDO. Mais adiante, no município de Nova Mamoré, o mesmo rio, encontrando-se com o rio BENI, que também vem da Bolívia, recebe o nome de RIO MADEIRA, que, depois de mais de 20 cachoeiras, chega a Porto velho e com mais  quatro dias de viagem de barco, vai desaguar no rio Amazonas, estado do Amazonas. Como toda a Amazônia este Estado e Diocese é verdadeiro pantanal, cortado por inúmeros e variados afluentes destes dois rios, que poderiam ser chamados espinha dorsal da Diocese. Verdadeira renda aquática, com uma extensão de 89,700 Km² e 176.709 habitantes, dos quais 7.000 são índios, agrupados em 25 povos, em sua absoluta maioria já aculturados, mas vivendo em comunidades próprias nas quais não se pode entrar a não ser com licença do cacique, chefe supremo e absoluto da tribo. Esta população está divida em três Regiões Pastorais:

SEDE: 03 Paróquias, 14 Comunidades Urbanas  e 58 Comunidades Rurais.

CENTRO: 04 Paróquias, 14 Comunidades Urbanas e 156 Comunidades Rurais.

SUL: 04 Paróquias, 19 Comunidades Urbanas e 174 Comunidades Rurais.


   II. QUEM SOMOS ?

    O que chamamos de "nossa missão ribeirinha na Diocese de Guajará-Mirim",  é uma minúscula parte desta totalidade, dividida em dois setores: Comunidades da beira dos rios e Comunidades dos Ramais: estradas que saem dos rios e se ramificam em pequenos sítios e fazendas.
    Esta divisão é determinada pelo tempo das chuvas, em que os rios estão altos e permitem navegação (inverno) de Dezembro-Janeiro a Junho-Julho e pelo tempo da seca, em que os rios estão baixos e quase impossibilitam a navegação (Verão): de Junho-Julho a Dezembro-Janeiro

    1. LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA: Minha área de trabalho, NOS RIOS, é formada por 4 rios: Mamoré, Pacaás Novos, afluente do Mamoré, Rio Novo e Rio Ouro Preto, por sua vez afluentes do Pacaás Novos, numa extensão de mais 1.200 Km. Todos localizados a mais ou menos meia hora de voadeira 15. Depois do Porto de saída de Guajará-Mirim, do lado esquerdo de quem sobe o rio Mamoré, justamente na frente do Hotel-Floresta Pacaás Novos.  Para chegar na cabeceira de cada rio gastam-se dois dias de viagem, com a  mesma voadeira.
     Os rios são todos muito sinuosos e as casas são localizadas às suas margens. Na margem direita de quem sobe o rio Pacaás Novos estão as comunidades Indígenas, que estão só neste rio. Do lado esquerdo estão  as  não-indígenas, que habitam os três rios.

    OS RAMAIS, como já dissemos são estradas, que saem dos rios e se ramificam em pequenos sítios e fazendas. A diferença entre rios e ramais é que estes permitem um acesso muito mais rápido e seguro para a cidade. São seis ramais, numa distância de 30 a 70 Km da cidade. O acesso a eles é por terra  e com carro tipo jeep, devido ao estado lastimável das estradas. 
  
     2. LOCALIZAÇÃO DEMOGRÁFICA: Na fase áurea da borracha esta área foi muito mais povoada. Com a queda do preço da borracha, provocada também pela sua industrialização na Malásia, esta área entrou em processo de involução demográfica, contando, hoje com uma população indígena de 15 aldeias, 270 famílias e l.636 habitantes à qual se acrescenta uma população-não indígena de 15 comunidades, 127 famílias e 364 habitantes, numa média indígena de quase 7 pessoas por família e não indígena de duas pessoas. Mas tem-se que tomar em consideração que a família indígena mora toda na aldeia, enquanto a família não indígena, em sua maioria, a mãe fica na cidade ("rua") com os filhos, por causa da escola.
    Os ramais só tem população não-indígena, contando com 06 comunidades, 20l famílias e 303 habitantes.
    A população total geral da missão, então, na minha área é de: 498 Famílias das quais 228 não-indígenas e 2.303 habitantes dos quais 667 não-indígenas. 

    3. LOCALIZAÇÃO ECONÔMICA: A produção dominante, que garante a sobrevivência desta população, tanto ribeirinha, como dos ramais é a FARINHA DE MANDIOCA, cuja produção é do ano inteiro. A coleta da castanha e de outras frutas é sazonal, a plantação de arroz, feijão e milho é só para consumo da família e a extração da borracha é feita em escala bem reduzida, por filhos de antigos seringueiros. Nos ramais também é forte e frequente a criação e exploração do gado para leite e carne. Não se encontra nestas áreas a exploração de legumes e hortaliças, justificadas pelas pragas e fraqueza do solo.
   Toda a produção da área é comercializada na cidade, sofrendo a exploração de seus preços.
   
    4. LOCALIZAÇÃO SANITÁRIA: Se a saúde vai mal em todo o Brasil, mesmo nas cidades, imagine nesta área ribeirinha e dos ramais. Ela não apenas vão mal, mas inexiste. Em geral não há Postos de Saúde. Quando os há, não há medicamentos. Como me disseram numa comunidade: "Aqui o agente de saúde só aparece de vez em quando, trazendo camisinha e hipoclorito, para a água.”
    
   5. LOCALIZAÇÃO DA ESCOLA E INSTRUÇÃO: onde há escola, falta professor(a). Onde há professor, falta material e merenda. O Professor tem que ir todo mês buscar seu salário na cidade e por lá fica, por falta de meio de transporte que o traga de volta. As escolas funcionam até o antigo quarto ano. Depois os adolescentes têm que ir para a cidade, continuar seus estudos. A mãe vai junto para cuidar dos filhos, enquanto o pai, ou fica na roça, ou ali volta frequentemente, para cuidar do ganha-pão da família. Em geral o professor dura um ano e cada ano temos o rodízio de professores. Isto para não falar de outros problemas, como, professores mal preparados, viciados, irresponsáveis....

   6. LOCALIZAÇÃO RELIGIOSA: Todo o trabalho de evangelização, atendimento e assistência religiosa, da área ribeirinha, até 2007 era  feito através das famosas DESOBRIGAS, quando o missionário, dependendo do número da população e condições do lugar, ficava à disposição do povo, o tempo necessário, para que este pudesse "desobrigar-se" de certos deveres cristão, como: batizado, crisma, primeira eucaristia, casamento na Igreja, confissão, comunhão , bênçãos. Esta era, também a ocasião, da evangelização, que diante de todas estas funções tinha um tempo muito reduzido, sem possibilidade de provocar uma opção e adesão de fé consciente, convicta pessoal e livre. A partir disto, o que encontramos, a nível religioso foi:
   Quase totalidade foi batizada. Quase totalidade dos casais, não se casou no Religioso e já está na segunda e terceira união. Absoluta maioria não fez a Primeira Eucaristia. A totalidade não foi crismada. A ignorância religiosa é muito grande: das orações só se sabe,mais ou menos, a Ave-Maria. Ignora-se o Pai Nosso, o Creio em Deus Pai, nem se imagine.... e as orações da Missa. Imagine-se, então, o nível de conhecimento religioso, totalmente nulo. Esta foi à situação que encontramos, em 2007.
   
    Esta é a realidade, na qual Cristo nos chama a trabalhar. Verdadeira área excluída e de excluídos. Nesta realidade, o que poderemos fazer. Que  trabalho realizar?! É o que iremos ver no próximo texto.